novembro 07, 2005











PARIS A ARDER

Paris está, de facto, a arder. Mas, estes fogos postos são um pequeno rastilho aceso dos fogos que estão para vir. Quem deixar o centro de Paris e as suas conotações fantasistas e românticas pintadas de Sena e Torre Eiffel, de cafés e boulevards, de croissants e gastronomia, e decidir apanhar a rede de metro suburbana e deixar-se arrastar pela viagem à «grande banlieue parisienne», sabe que o aguarda o inferno no fim da linha. É como passar de um mundo para outro, nos antípodas. Os subúrbios de Paris, onde moram tantos imigrantes, entre eles os portugueses, são uma massa de desumana arquitectura, talhada e arrumada de propósito para mostrar a quem lá vive a sua alienação e a sua diferença desintegrada. É uma arquitectura monstruosa e apocalíptica, de corredores desabrigados e materiais frios, sem vida comunitária. Lugares onde as pessoas vivem como em gaiolas, atomizadas, isoladas, reduzidas à ínfima espécie da sua condição menor.
Por mais que a França igualitária, republicana, fraternal e idealista, criadora dos Direitos do Homem e herdeira espiritual do Iluminismo queira pensar e repensar o fenómeno da integração dos imigrantes e da suas políticas, o facto saliente é este: ninguém, salvo escassíssimas excepções, está integrado. Magrebinos, negros, árabes, os grupos mais representados, quase todos eles um subproduto residual do colonianismo francês e das suas guerras de libertação, sabem à partida que podem trabalhar em França, viver em Paris, mas, viverão sempre à sombra da luz que ilumina os brancos e os filhos da terra e do sangue. O racismo francês, latente ou explícito, contaminou sempre a sociedade francesa, uma das sociedades mais chauvinistas e xenófobas do mundo, apesar da capa «cultural» e das manias snobs dos intelectuais que gostam de «descobrir» culturas marginais mas, nunca, de as integrar de pelo direito como francesas ou europeias. A integração cultural, falsa, assente em meia dúzia de participações controladas dos estrangeiros «escolhidos», não oculta nem pode ocultar a separação profunda e radical entre o Estado francês e os grupos étnicos que lhe são estranhos, pelos hábitos, as tradições, a pobreza, a ignorância e a cor da pele.
Esta gente, remetida para guetos donde só saem para trabalhar, espera na ansiedade, na raiva e no desespero. Paris não é Londres nem Nova Iorque, que acolheram sociedades multirraciais sem fracturas nem degradações tão humilhantes como as que atingem os imigrantes em França. Paris não é, sequer, Berlim. É uma capital de luxo e bem-estar, cercada de arame farpado e favela melhorada. Nem Sarkozy, nem Villepin, nem os decrépitos partidos franceses e os seus dirigentes, mais um Chirac decadente e na recta final, estão preparados para enfrentar este magno problema, que requer mais do cargas policiais e manifestações de força e autoridade. Estes imigrantes desafectados tornar-se-ão, no seu abandono, um perigo sociológico e uma subcultura de crime e desvio da norma.

(Clara Ferreira Alves in
Diário Digital)
(Foto:Thierry Bordas)

14 Comments:

Blogger Inha said...

Perante este cenário, os senhores dirigentes ainda esperam que "alguém" reivindique os atentados? Não perceberam ainda que o maior terrorista é a fome?

07 novembro, 2005 12:55  
Blogger Lúcia said...

os franceses são um povo racista, que mais se pode dizer. tenho que ir a Paris, ainda este mês e confesso que estou com receio.

07 novembro, 2005 14:23  
Blogger Inha said...

Ora aí está uma opinão com a qual me identifico, Bastonadas. Esta onda de emigração na europa está a atingir níveis alarmantes e não há legislação capaz de travar esta torrente. E também não creio que seja somente um problema rácico, mas sim de saturação, do aumento vertiginoso do desemprego na europa, onde os recursos são cada vez mais escassos. O que é certo é esta gente é oriunda de países sistematicamente roubados pelos europeus, ou seja, sentem-se no direito de vir buscar a fatia do bolo que lhes pertence ou a que sentem ter direito. Mas a entrada descontrolada de imigrantes na europa não é solução. Muito menos em Portugal. Não faço ideia do que possa vir a ser uma situação destas na Cova da Moura e afins. Se a nossa polícia não contorna pequenos distúrbios, nem quero pensar no que seja, se a moda pega.;)

07 novembro, 2005 15:26  
Blogger Dinada said...

Sabes, Inha, não faltará muito para que o fenómeno alastre...

Estou tão expectante quanto apreensiva!

07 novembro, 2005 15:30  
Blogger mfc said...

A criação de ghetos nunca resolveu problema algum, antes o agudiza pela concentração estúpida de descontentes cheios de razão.
Entenda-se razão, mas não para os métodos que usam. A garrafa de champagne um dia estoira mesmo!

07 novembro, 2005 16:15  
Blogger Diafragma said...

É de facto um problema de uma complexidade que me ultrapassa, mas parece óbvio que os "Números clausus" vão ter de aparecer como referiu o "bastonadas". Quando já não há que chegue para nós torna-se absurdo absorver mais pessoas, sendo certo que não há orçamento que as integre. Mas é horrível assistir à velha imagem do barco que deixa morrer os náufragos na água para salvar a sua tripulação.

ps: obrigado pela visita e pelos simpatiquíssimos comentários

07 novembro, 2005 16:59  
Anonymous Anónimo said...

Pois é, mas parece que já 'tou a vêr um problema pareceido aqui em Portugal, não tarda nada, até porque como toda a gente sabe, troia vai ser modificada, vai ser precisa mão de obra, não a vamos ter em Portugal, tem de vir lá de fora e já não chega os problemas que aqui temos, tendem os mesmos a piorar. não 'tou a vêr luz ao fundo do tunel.

07 novembro, 2005 17:36  
Anonymous Anónimo said...

O "bastonadasnacionais" disse (quase) tudo, excelente comment esse, que subscrevo.

07 novembro, 2005 20:43  
Blogger cumixoso said...

ai ai ai oe meninos e as meninas... daqui pouco vem ai o sr (nem sabem como que custa chamar-lhe assim) do SOS Racismo dizer-lhes das boas... Em França, já se esqueceram do que despoletou esta situação... só sabem que um Ministro lhes chamou "escumalha", e isso já é motivo para a anarquia...

07 novembro, 2005 21:29  
Blogger Inha said...

Bom dia a todos!:)

Bom dia PR, BJS!:D

Pictured Words, bem vindo!:)

08 novembro, 2005 09:14  
Anonymous Anónimo said...

Bem pelo que aqui li, a solução proposta por cfa é dar carinho aos imigrantes...e empregos de topo mm q não tenham qualificações para tal, e dinheiro e mansões de luxo para que eles se sintam integrados...trabalho?esforço individual?Respeito pelo estado de direito democrático?isso é pros brancos e não muçulmanos...cfa sabe perfeitamente que antes de viverem nesses guetos magrebinos, negros e árabes, viviam lá portugueses e outros imigrantes não magrebinos,negros e árabes,curiosamente os filhos destes imigrantes sentem-se na sua maioria de bem com a vida e não provocam este tipo de situações.Pq será?Qd cfa está a falar que estes grupos não têm nehuma esperança de sucesso mente.existem pessoas destes grupos que triunfam.Mas estes estudam e trabalham.Não se estão a cagar prá escola e passam os dias a fazer merda comno os marginais que andam por aí a incendiar.Putos dos 15 aos 20 anos quase todos sem idade pra trabalhar(depois falam das txs de desemprego!devem-se fartar de ser rejeitados nas entrevistas tou a ver!).Qd eles desistem da escola, culpa-se a escola que está dirigida pra classe média.Qd eles batem, culpa-se o françês que é "dos mais racistas e chauvinistas do mundo".Qd eles roubam, culpa-se a miséria que os atinge(já agora convém dizer que a miséria que existe em frança é um luxo em muitos países enre os quais o nosso).Culpa-se então a desigualdade, mas a protecção social em frança é das mais completas do mundo apenas superada pela dos paises nórdicos, onde curiosamente na dinamarca tb surgem problemas do género (provocados por muçulmanos que surpresa!será que o dinamarqueses serão tb dos mais racistas e xenófobos do mundo?)Não será que os imigrantes não muçulmanos não terão outra atitude perante a vida e o país?Não será que escolhem lutar por uma vida melhor em vez de se vitimizarem a si e aos outros?
Quanto á integração cultural, alqguém acredita que é o Estado que marginaliza a cultura islâmica?Não são eles que se auto-ecluem e que se marginalizam?Não são eles que não toleram os judeus?não são eles que não se querem misturar com ocidentais?a sua afirmação nunca se faz através da cooperação mas sim através do conflito(normalmente conflito vilonto mm á bruta!).
Onde entra na cabeça de cfa o conceito de responsabilidade individual?Não me vai dizer que os guetos em Paris são como as selvas africanas em que os índigenas matam e esfolam para sobreviver?
Deixem-se de desculpas e façam pela vida!

08 novembro, 2005 10:18  
Blogger Inha said...

Olá João do Greg, bem vindo!:)

Frisaste bem a questão da auto-vitimização e consequente auto-segragação. Isto é um problema sério que não se passa só nos ghetos, longe disso! Passa-se dentro das melhores empresas, onde toda e qualquer tentativa de se chamar à pedra um indivíduo de outra raça é "transformada" por eles num acto xenófobo e rácico, eles escudam-se neste tipo de atitudes e torna-se extremamente delicado lidar-se com essa gente. Eu digo isto olhos nos olhos de qualquer pessoa, porque vi! Assisti!
Agora também julgo que haverá dois tipos de imigrantes: os que conviveram com os colonos e os que nunca tiveram contacto com a civilização europeia (se lhe posso chamar isso). O problema reside nos últimos. A meu ver.;)

08 novembro, 2005 11:09  
Blogger deep said...

as fontes conflitos não estao apenas do outro lados das fronteiras...estão dentro delas...e isso é uma realidade recente que requer respostas transversais e urgentes...por isso a França deve ser um alerta para olharmos a nossa realidade tb...

08 novembro, 2005 11:41  
Blogger Inha said...

Bom dia CM, bem vindo!;)

08 novembro, 2005 12:27  

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